quarta-feira, 18 de junho de 2014

Um pouco de solidão - 27/03/52














N. York, 27 de Março de 1952.


Minha querida Zoca:

Hoje é 6ª. Feira e terminei o meu estágio aqui com o G. Mackey, o irlandês-americano, um homem de 1,90 de alt., louro, de óculos, sempre com um cachimbo à boca. Temos visitado várias firmas atacadistas e lojas, que compram e vendem Pyrex, e acho que foi bem proveitosa a temporada aqui para o futuro Pyrex brasileiro

O difícil de aguentar nesses americanos é a questão da bebida

Como eles bebem, meu Deus


Esse irlandês, então, me levou uma parte dos dólares, porque eu, naturalmente querendo ser amável, pois, o coitado estava sendo também amável em suportar este estrangeiro, sempre prontifiquei-me em pagar-lhe os wiskies e o taxi, quando ele não estava com o carro próprio. 

É verdade que os dólares não são os meus, nem os do meu salário de 75.00 semanais que a Corning me paga. Quando vim para N.Y., o dr. Hicks deu-me 250.00 para as despesas desta semana aqui, e naturalmente, ao prestar contas na volta a Corning, vou mencionar as despesas que tive comigo e com o irlandês-americano Mackey. 


Ficamos amigos e ele chegou a pedir-me pra que indique o nome dele para ir ao Brasil ajudar a preparar os vendedores!... Bobagem, porque não adiantaria nada termos ai um americano a ensinar brasileiros sobre como se vende Pyrex nos EE.UU...




Amanhã, sábado, vou aproveitar para fazer algumas compras e alguns passeios nos arredores, o que não tive tempo de fazer porque sempre chegava tarde ao Hotel, visto que o americano (Mackey) não me largava e jantava comigo. 

Pudera, tudo era pago pela CGW...

Regresso à Corning domingo à noite, pelo trem noturno, devendo estar em Corning, se Deus quizer, 2ª. Feira, às 9 horas. 

Parece que de lá terei de passar uma semana em Leaside, Canadá; e depois, terei de ver o que vão resolver.

Apezar de estarmos na primavera, os dias continuam frios, e o povo, e eu também, sempre sai com capa ou sobretudo.


Estou com um pouco de dor de cabeça por causa dos drinks. Tanto que hoje comecei a recusar e a dizer que são ordens do médico

Peço então leite ou refresco e eles então acham graça, mas quando falo que são ordens do médico, eles imediatamente se conformam.

Eles têm um medo tremendo de ficar doentes e a palavra do médico é qualquer coisa séria aqui. Há poucos remédios nas drogarias que se possa comprar para uso sem prescrição médico. Dos analgésicos por ex., estou arrependido de não ter trazido mais Cibalena, pois, só encontro simples Aspirina... 


Não tenho dormido muito bem: as preocupações absorvem a gente, pois, os problemas a defrontar ai são muitos. Passo dias inteiros sem dizer uma palavra em português, e, quando falo sosinho, parece qualquer coisa estranha



É preciso você escrever duas vezes por semana, contando as artes dos moleques e as novidades de casa, de você, dos parentes, etc. 

Para ser-lhe franco, minha querida, ouça aqui, bem no ouvido
eu estou com muitas saudades de você... e isto já está ficando um pouco “chato”

Enfim, vamos aguentando.

Um beijo gostoso e saudoso do marido que te ama muito,

Homero



Beijos nas crianças e lembranças a todos de casa e parentes.

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